York City, da Inglaterra, e seu estádio, Bootham Crescent: a torcida é quem manda
Quem vê pela TV a torcida do Corinthians, ou do Palmeiras, ou do Flamengo, entre outras chegando a invadir as sedes dos clubes, cobrar pessoalmente da diretoria e dos jogadores melhores resultados pode até pensar que eles estão perdendo tempo. Na teoria estão sim, pois os estatutos de cada equipe citada não prevêem a participação dos fãs nas decisões administrativas. E realmente fica muito difícil imaginar quem um torcedor possa dar as cartas em um time de futebol. Fica apenas o "papo furado" do mandatário dizendo que "o clube é patrimônio de todos" e coisa e tal...
Eis que existe sim uma equipe em que quem manda é a torcida. Como apreciador do futebol inglês, estive passeando pelos sites oficiais de diversos clubes britânicos - por sinal muito bem feitos e com bastante visão profissional do mercado do futebol. Em certo momento, para minha surpresa, deparei-me com uma agremiação basicamente gerida pelos seus fanáticos entusiastas: o York City.
Fundado em 15 de março de 1922, os Minstermen, como são mais conhecidos pela torcida, sempre foram meros figurantes do Campeonato Inglês, quando chegaram ao "ápice" apenas com uma conquista da Quarta Divisão, em 1984, e um 4º lugar na Copa da Inglaterra (FA Cup), em 1995 - feito este que tornou o York a primeira equipe da terceira divisão a ficar entre os quatro melhores times do torneio. Seu estádio, o Bootham Crescent, não abriga nem 10 mil pessoas (9.612, oficialmente).
Porém, como nunca foi um time de grande porte, o York City começou a passar maus bocados, financeiramente falando, a partir da década de 90, quando por má administração, o então dono do clube Douglas Craig passou a gastar dinheiro além das possibilidades do clube. Com isso, as dívidas começaram a se amontoar e os resultados não virem.
Com o time começando a ficar aos frangalhos, Craig tentou dividir o patrimônio em duas partes: a primeira controlava o clube de futebol (e estava praticamente falida); a outra administrou estádio de Bootham Crescent. Em dezembro de 2001, Douglas Craig colocou o clube à venda e disse que, se não fosse encontrado um comprador até o final da temporada, fecharia o York e o tiraria da liga inglesa.
Não querendo assistir à deterioração de sua equipe passivamente, um grande grupo de torcedores resolveu tomar uma importante iniciativa que mudaria a trajetória decadente dos Minstermen: a compra do amado York City através da criação do Supporters Trust, em 2002, que em pouco mais de um mês já juntava algumas centenas de membros. Hoje, o número de pessoas que contribuem com o grupo supera 2 mil.
Contudo, com o Supporters Trust ainda dando seus primeiros passos, não seria ele que compraria o York. Quem apareceu como salvador da pátria ainda no começo de 2002 foi John Batchelor, que comprou o clube pela simbólica quantia de 1 libra. O empresário recebeu o apoio da torcida, mas logo provou ser um engano. Sob sua tutela, a situação do clube só piorou. Com as dívidas chegando perto dos US$ 2 milhões, o time não teve outra alternativa a não ser pedir concordata. Segundo os administradores, se dinheiro não fosse injetado, o York City fecharia as portas ao final da temporada 2002/2003.
Foi aí que entrou o papel da torcida. Após mais de um ano de intenso trabalho e unindo esforços, o Supporters Trust conseguiu levantar verba suficiente para fechar um acordo com os credores, assumir o controle do York e quitar as imensas dívidas. O clube estava salvo, mas havia ainda um problema: o pequeno estádio de Bootham Crescent.
Em 2002, o ex-presidente Douglas Craig havia se desfeito apenas do clube, mas continuava dono do estádio, que fica até hoje em uma área bastante valorizada da cidade. Seu plano era acabar com a cessão do campo à equipe ao final da temporada 2003/2004 e vender a casa dos Minstermen a uma construtora, que ergueria uma série de casas no local. Mais uma vez entraram em cena os abnegados torcedores do York City. O Supporters Trust, junto com uma outra associação de fãs, chamada Friends of Bootham Crescent, conseguiu desfazer o negócio de Craig. Embora não tenham comprado o estádio, conseguiram garantias reais de que o York seguirá jogando em Bootham Crescent indefinidamente, sua casa desde 1932.
O que mais me chamou atenção nessa visita à história do York City foi o fato de que todo esse trabalho árduo foi feito para salvar um clube bastante modesto na Inglaterra, que sequer conquistou títulos importantes. Para se ter uma idéia de quanto surpreendente é a coisa, em plena crise, na temporada 2003/2004, o York ainda conseguiu manter uma média de público de cerca de 4 mil pessoas - uma marca fenomenal para um time da quarta divisão e afundado em dívidas.
Mais do que sucesso e conquistas futebolísticas, o York City Football Club provou ser um verdadeiro símbolo da força de uma torcida fanática. Aqui sim pode-se dizer que o torcedor é quem manda.
Imagem: arquivo pessoal
Foto: crowd-management.com
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