Estava ontem assistindo o filme "À espera de um milagre" (EUA/1995) e logo me veio à cabeça um livro que não cheguei a lê-lo por inteiro, mas que trata de uma história muito interessante: "O milagre de Castel di Sangro", de Joe McGinniss. Vamos falar um pouquinho dessa história.
O Castel di Sangro é um pequeno clube italiano que disputa a Eccellenza, campeonato equivalente à 6ª divisão da Itália. Foi fundado no ano de 1953 e desde 2005, por motivos financeiros e administrativos, mudou seu nome para Associazione Sportiva Dilettantistica Pro Castel di Sangro, ou simplesmente Pro Castel di Sangro.
Situados na região de Abruzzo, na província de L'Aquila, os Sangrini, como são chamados pelos torcedores, foram criados na década de 50 a partir de partidas entre amigos organizadas pelo padre Don Arbete, um aficcionado pelo calcio. Quase sem nenhuma estrutura, o grupo de jogadores se reunia em campos de terra batida no pequeno vilarejo de Castel di Sangro com bolas feitas de meia. Com o passar do tempo os confrontos começaram a se tornar freqüentes e o sucesso de público também. Então, a partir de 1953, fundou-se o antigo Castel di Sangro Calcio.
Como todo clube italiano recém inscrito, o Castel di Sangro iniciou sua jornada no Campeonato Italiano na Terza Categoria (a décima e última divisão do país) e por lá ficou por 30 anos. Na temporada 1982/83 aconteceu a primeira promoção da história do time, que disputaria a Seconda Categoria. Apesar das dificuldades e da minúscula estrutura, o time da região de L'Aquila conseguiu sua segunda ascensão dois anos mais tarde para a Prima Categoria.
Nessas três divisões ainda disputam times semi-profissionais. A partir da 7ª divisão (A Série C2, que possui 3 divisões internas) os clubes devem ser estritamente profissionais para poderem participar do campeonato. Foi o que aconteceu com os Sangrini na temporada 1988/89, quando entraram para a C2.
Para um time cuja cidade sede possui pouco mais de 5 mil habitantes e que, curiosamente, seu estádio, o Teófilo Patini, possui capacidade para abrigar 7720 pessoas - mais que a população da vila onde está situado - estar no 5º escalão do futebol italiano já era motivo de orgulho. Vale salientar que por lá passaram times com tradição em participar da Série A, como Ascoli, Avellino, Lecce, entre outros. O então presidente do Castel di Sangro, Gabriele Gravina, trouxe o treinador Osvaldo Jaconi, que conseguiu realizar o seu primeiro feito: elevar o pequeno clube da região de Abruzzo à Série C1, a 4ª divisão nacional, na temporada 1994/95. Só que Gravina não estava plenamente satisfeito.
Corria a temporada 1995/96 e o Castel di Sangro lutava bravamente para entrar nos playoffs de acesso à Série B. O sonho parecia estar perto e o Gualdo era o seu primeiro obstáculo. O placar agregado terminou 1 a 1, o que deu a vaga para o último playoff contra o Ascoli. A essa altura a promoção era algo palpável, mas bastante difícil, visto que o próximo adversário o havia batido nas duas vezes em que se enfrentaram pelo campeonato. Na partida única, sofridos empates sem gols no tempo normal e na prorrogação só aumentavam a tensão dos Sangrini. Porém, Jaconi surpreendeu a todos com uma substituição bastante inusitada: colocou o goleiro Pietro Spinosa, que havia entrado em apenas 7 partidas na competição, para defender as penalidades. O tempo passava e as cobranças se sucediam sem que nenhum lado despediçasse sua chance. Foi aí que brilhou novamente a estrela do treinador, quando na 8ª cobrança Spinosa fez uma magnífica defesa e garantiu o 8 a 7 e a inédita e histórica promoção para a segunda divisão. Para muitos cronistas e desportistas, o feito foi um verdadeiro milagre, visto as mínimas condições do pequeno clube. Daí a idéia do livro de Joe McGinniss.
Assim o Castel di Sangro entrou para a história do futebol italiano como o time cuja sede tinha a menor população em todos os tempos na Série B. No torneio, em sua primeira temporada (1996/97), muito tumultuo e desorganização. Como o estádio Teófilo Patini não possuía capacidade suficiente para disputar a segunda divisão, o time teve que mandar seus jogos na vizinha cidade de Chieti. Além disso, dois de seus melhores jogadores na época, Danilo di Vincenzo e Pippo Biondi, faleceram em um acidente automobilístico. Outro atleta, Gigi Prete, foi flagrado com uso de drogas com a conivência do presidente Gabriele Gravina - ambos foram presos. Por fim, o meia ganês Josef Addo, ex-PSV e capitão da seleção de seu país, já estava acertado com o clube, entretanto, Osvaldo Jaconi vetou sua transferência. Apesar de todos esses contratempos o Castel di Sangro conseguiu manter-se na Série B para a próxima temporada e dar prosseguimento ao milagre.
Porém, a temporada seguinte foi agonizante, que culminou no rebaixamento do clube à Série C1 (a primeira desde 1982/83). Alguns anos depois mais um revés: a queda para a C2. Em 2005 o ponto final na trajetória miraculosa do Castel di Sangro Calcio - problemas de ordem financeira e administrativa fizeram com que seus dirigentes fechassem o clube e fundassem outro em seu lugar, o Pro Castel di Sangro. Como já citado no início desta postagem, o clube teve que reiniciar toda a sua trajetória desde os níveis mais baixos do futebol italiano. Atualmente está disputando a 6ª divisão nacional.
A equipe nunca conquistou títulos em âmbito profissional, mas mostrou que não é impossível sonhar quando se trabalha com seriedade, honestidade e determinação. No futebol, apesar de todas as dificuldades, sempre foi permitido sonhar. A história aqui relatada faz uma alusão ao filme citado no início. Quando se tem um objetivo não basta apenas esperar pelo milagre, mas sim correr atrás dos objetivos e fazê-lo tornar-se realidade. Por mais que tenha sido por pouco tempo, o diminuto Castel di Sangro, com seus pouco mais de 5 mil torcedores, conseguiu a proeza.
Abaixo, dados e estatísticas do "miraculoso" Pro Castel di Sangro:
ASSOCIAZIONE SPORTIVA DILETTANTISTICA PRO CASTEL DI SANGRO
* Fundação: 1953 (como Castel di Sangro Calcio).
* Local: Castel di Sangro/ITA.
* Presidente: Giuseppe Santostefano.
* Treinador: Emidio Oddi.
* Estádio: Teófilo Patini (7.720 pessoas).
* Uniformes: primeiro - camisas (detalhes em amarelo nas mangas), calções e meiões vermelhos; segundo - camisas (detalhes em vermelho nas mangas), calções e meiões amarelos.
* Importantes jogadores da história: Claudio Bonomi (meia), Gionatha Spinesi (atacante), Massimo Lotti (goleiro), Carlo Cudicini (goleiro) e Vicenzo Iaquinta (atacante).
Escudo: arquivo pessoal.
Foto: RAI
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