sábado, 27 de março de 2010

FUNDO DO POÇO NA INGLATERRA

Chester City: crise sem fim e expulsão de campeonato





O futebol europeu, notadamente o inglês, é decantado em vários meios de comunicação, páginas, revistas, blogs e etc como o suprassumo da organização e da profissionalização do esporte no mundo. E não deixam de ter razão quando falam isso. Entretanto não é só nos países subdesenvolvidos, especificamente o Brasil, que existe bagunça administrativa, lavagem de dinheiro e caos financeiro. Lá na terra bretã alguns clubes com muita tradição experimentaram ou experimentam atualmente desordem financeira, como o Manchester United e o Liverpool, ou o fundo do poço como os menos tradicionais Leeds United, Portsmouth e Chester City.

Uma olhada no blog do meu nobre amigo colorado Alexandre Perin, o seu sempre interessante Almanaque Esportivo, podemos ver detalhes sobre as últimas "quebradeiras" que aconteceram no Reino Unido justamente com os já citados Portsmouth e Chester City. Porém, a situação mais calamitosa é deste último. Vamos conhecer um pouco sobre esta modesta equipe do noroeste inglês?

O Chester City Football Club foi fundado no longíquo ano de 1885 simplesmente como Chester F.C. após a fusão de dois clubes - o Chester Rovers e o Old King's Scholars F. C. A princípio disputava apenas partidas amistosas e torneios locais. Somente a partir de 1890 os Seals participaram de sua primeira competição oficial: a The Combination League, um torneio que envolvia equipes do norte e noroeste britânico e de País de Gales. Chegou até mesmo a participar da Copa de Gales na metade inicial do século passado, tendo inclusive conquistado três títulos da competição (1908, 1933 e 1947). Seus primeiros títulos foram na temporada 1908/09, com as já comentadas Copa de Gales e The Combination League.

Sempre perambulando pelas divisões inferiores do futebol da Inglaterra, o Chester enfrentou diversas dificuldades pelo fato de possuir poucos torcedores (a cidade de Chester possui pouco mais de 77 mil habitantes) e de sempre ter possuído estádios acanhados com capacidade para menos de 8 mil pessoas. Tanto que na década de 30 o clube estava situado na 3ª Divisão Norte, equivalente à um quase insignificante 14º nível na pirâmide do sistema de futebol inglês. Porém o inexpressivo time conseguiu uma façanha na FA Cup em 1933 ao bater o tradicional Fulham por 5 a 0.

E meados da década de 50 o panorama começou a melhorar para o time de Cheshire, quando participou da 4ª divisão. Na temporada 1974/75, ainda disputando a Division Four, o Chester alcançou outro feito histórico: após passar por Walsall, Blackpool e Preston North End - o primeiro campeão inglês da história -, chegou às oitavas-de-final da Copa da Liga (Carling Cup) para enfrentar o tradicional Leeds Unites. Com gols de John James (2) e Trevor Storton, os Blues despacharam os adversários por 3 a 0 e seguiram para as quartas-de-final para enfrentarem o Newcastle United, outro clube de muita tradição. Já sendo considerado um feito histórico para um modesto clube da 4ª divisão, não considerou o favoritismo do oponente e também o eliminou com um gol de James. Agora seria a semi-final contra o Aston Villa, porém a grata surpresa da competição deu adeus à competição, mas fazendo jus à sua caminhada até as fases finais com uma derrota apertadíssima no placar agregado de 5 a 4.

No final da década de 70 um jovem jogador surgiu nas bases do Chester F.C. e viria a fazer história no futebol britânico - o atacante galês Ian Rush. É verdade que Rush não conquistou nenhum título com o time, entretanto com menos de 20 anos de idade os torcedores e olheiros já percebiam que se tratava de um atleta diferenciado e que poderia render ótimos frutos no futuro. Tanto que 2 anos após ser revelado e ter marcado 18 gols em 34 partidas foi vendido ao poderoso Liverpool, onde fez um tremendo sucesso e ganhou diversos títulos.

Em 1983 a então direção do Chester decidiu adicionar o sufixo "City" ao seu nome, que passaria a se chamar Chester City Football Club. Nesta época teve em seus quadros outro jogador que fez sucesso no futebol do país - o lateral direito Lee Dixon, que depois atuou por 14 temporadas pelo gigante Arsenal e teve participações na seleção inglesa. Chegou ao seu ápice na Football League ao competir na 3ª divisão em meados dos anos 80.

A partir dos anos 90 começaram os problemas de ordem financeira do clube. Em 1992 inaugurou seu atual estádio, o diminuto Deva Stadium, com lotação máxima para 5328 espectadores. Dois anos depois uma crise interna generalizada provocou a saída de seus principais jogadores e de seu treinador Graham Barrow, que fez com que o Chester City fosse relegado à Division Three (à época a 4ª divisão nacional). Sob a administração de Mark Guterman, a equipe começou a sofrer colapsos financeiros a partir de 1998, entrando em estado de administração. Em 2000 os Azuis afundaram de vez em crise ao deixarem a Football League e cairem para a Football Conference, a liga semi-profissional da Inglaterra equivalente à 5ª divisão em diante. Após alguns anos evitando rebaixamento e de raras participações nos play-offs de acesso, o clube voltou à 4ª divisão pelas mãos do treinador Mark Wright, ex-zagueiro do Liverpool, na temporada 2004/05. Entretanto o caos administrativo ainda imperava sobre o Deva Stadium e na semana de reestréia na Football League Mark Wright era dispensado do comando técnico. Keith Curle assumiu e não conseguiu obter resultados positivos. Com o perigo de novo rebaixamento, Wright foi chamado novamente para assumir o banco de reservas e conseguiu evitar o pior.

A bagunça impregnou-se de vez em Chester a partir de então. Como se já não bastassem as constantes trocas de dono e o aumento das dívidas, o time ainda conseguiu a "proeza" de ser desqualificado da FA Cup por escalar o meia Stephen Turnbull sem estar devidamente regularizado diante do Bury na temporada 2006/07. Daí o drama foi só aumentando até ser novamente relegado à Conferência Nacional. Há dois anos, já sob a administração de Stephen Vaughan, novamente entrou em estado administrativo e teve 10 pontos retirados. Em julho do ano passado com dívidas de 7 milhões de Libras o Chester City mais uma vez pediu concordata e desta vez perdeu 25 pontos na competição devidos às diversas regras infrigidas como dívidas e salários atrasados. Se já não havia dinheiro, não havia sequer jogadores aptos a serem escalados, com falta de pagamento a atletas e funcionários, crise diante dos torcedores e com um saldo de 25 pontos negativos, restou à Football Conference (entidade que rege as ligas semi-amadoras do futebol inglês) expulsar o clube do torneio, anular todos os seus resultados e fazer com que a Conference tenha uma equipe a menos na disputa.

Na tentativa de "ressuscitar" o Chester City, a família Vaughan tentou vendê-lo por uma Libra, mas um consórcio dinamarquês não concluiu a negociação. Dessa forma, caso pretenda retornar às competições, o Chester terá que começar das divisões inferiores amadoras, ou seja, da inexpressiva 21ª divisão.

Por isso que mesmo em países em que o futebol é o mais rico, o mais organizado, o mais competitivo, coisas amadorísticas como essas não só fazem parte do rol de adjetivos das naçoes do terceiro mundo. Se as federações e os torcedores não abrirem o olho, independente de condições sócio-econômicas e adminitrativas, o esporte mais popular do planeta pode sofrer manchas difíceis de se apagarem e chegar ao ponto de clubes, tradicionais ou não, sofrerem um vexame como este do Chester City. Que sirva de lição para todos os cartolas por todo o mundo!

Abaixo, dados e estatísticas do expulso Chester City.


CHESTER CITY FOOTBALL CLUB

* Fundação: 1885 como Chester F. C.

* Local: Chester/ING

* Presidente: Stephen Vaughan

* Estádio: Deva Stadium (5328 pessoas)

* Treinador: Morell Maison (até a expulsão do clube)

* Títulos (15): Copa de Gales (1908, 1933 e 1947), The Combination League (1908/09), Cheshire County League (1921/22, 1925/26 e 1926/27), Division Three North (1935/36), Division Three North Cup (1936 e 1937), Debenhams Cup (1977), Division Four (1985/86), Division Three (1993/94), Bob Lord Trophy (2001), Conference Championship Shield (2001/02) e Football Conference (2003/04)

* Principais jogadores: Ian Rush, Lee Dixon, Ray Gill, Trevor Storton, John James, Stuart Rimmer, Gary Talbot, Angus Eve e Billy Lewis

* Jogador que mais vestiu a camisa: Ray Gill (406 jogos)

* Maior artilheiro: Stuart Rimmer (135 gols)





Escudo: arquivo pessoal
Foto 1: Site oficial do Chester City F. C.
Foto 2: Chester Chronicle

Um comentário:

minas disse...

Éé, que sirva de lição!
Bom blog, parabéns.
abraços