sexta-feira, 26 de junho de 2009

ELES ASSOMBRARAM O MUNDO, MAS NO MELHOR SENTIDO

Coréia do Norte: de volta à Copa do Mundo após o assombro de 1966






Hoje em dia quem fala da Coréia do Norte logo tem em mente a imagem do louco, demente e insano ditador Kim Jong-il e suas idéias nefastas de produzir uma bomba nuclear para colocar temor no mundo. Mas falar dos norte-coreanos também pode levar a recordar outro tipo de assombração totalmente aceitável e até surpreendente, como veremos no decorrer dessa publicação.

Na semana que passou a seleção da Coréia do Norte assegurou seu retorno a uma Copa do Mundo após 44 anos de ausência ao empatar por 0 a 0 com a Arábia Saudita fora de casa (foto 2). A partida foi válida pela última rodada do Grupo B da fase final das Eliminatórias Asiáticas para o Mundial de 2010. Com o resultado os norte-coreanos asseguraram a segunda vaga direta para o torneio, atrás da rival Coréia do Sul, e à frente dos sauditas pelo saldo de gols. Aliás esta será a primeira vez que as duas coréias participarão de uma mesma Copa.

A primeira - e única até então - participação dos coreanos do norte em uma Copa foi no longínquo ano de 1966 (foto 1), quando a competição foi realizada na Inglaterra e vencida pelos donos da casa. Nesta edição os asiáticos provocaram outro tipo de furor ao mundo, muito mais agradável. Foram a grata sensação do torneio após a histórica vitória sobre a poderosa Itália, no dia 19 de julho de 1966, em Middlesbrough, que possibilitou a classificação dos coreanos à fase seguinte - fato este que configurou-se na primeira seleção da Ásia a passar da fase de grupos na história das copas.

Inserida no Grupo 4 da Copa do Mundo, a seleção da Coréia do Norte chegou totalmente desacreditada à Inglaterra, dado o seu futebol ser ainda, à época, totalmente amador. Na cabeça de 10 entre 10 profissionais da crônica esportiva davam como certa a possível humilhação a ser sofrida pelos franzinos norte-coreanos nos 3 jogos que iriam disputar contra Chile, União Soviética e a então bicampeã mundial Itália - todas no Ayresome Park em Middlesbrough. De fato na primeira apresentação, diante dos soviéticos, uma derrota considerada dentro dos padrões por 3 a 0, com gols de Eduard Malofeyev (2 vezes) e Anatoliy Banishevskiy.

Porém a surpresa começaria a aparecer na segunda partida contra os chilenos. Rubén Marcos abriu o placar de pênalti aos 25 minutos da primeira etapa para os sulamericanos e todos voltaram a prever outra derrota dos coreanos. Mas imprimindo uma enorme correria e provocando um grande desgaste ao adversário que não conseguia acompanhar seu ritmo frenético, os norte-coreanos literalmente "venceram pelo cansaço" e chegaram ao surpreendente gol de empate a 1 minuto do fim do jogo com Pak Seung-Zin. A euforia foi completa nos vestiários asiáticos com o resultado histórico após o confronto, mas o melhor estava por vir.

Pela frente, na última rodada da fase de grupos, os temidos italianos, que vinham fazendo apenas uma campanha razoável após vitória de 2 a 0 sobre o Chile e derrota para os russos por 1 a 0. Cerca de 18 mil espectadores esperavam uma vitória fácil dos italianos e sua consequente classificação à fase seguinte no Ayresome Park. Eis que surgem os dois times para darem início à partida. Entretanto o que se viu foi praticamente uma repetição do jogo entre coreanos e chilenos: muita correia pelo lado asiático e uma marcação adversária meio perdida tentando correr atrás do prejuízo. Como resultado a conhecida solidez da defesa azzurri foi vencida pela impressionante velocidade dos Chollima (cavalo alado) e Pak Doo-ik marcou o gol que entrou para a história do futebol das Copas do Mundo aos 42 minutos do primeiro tempo. A segunda etapa foi idêntica à primeira, com um jogo de muita velocidade os cavalos alados ofereceram muito perigo à meta italiana ao mesmo tempo que conseguia suportar a pressão adversária que possuía maior qualidade técnica. Final de jogo e a multidão presente ao estádio saiu atônita com o surpreendente resultado. Os coreanos saíram do estádio ovacionados pela fantástica apresentação e classificados para a fase seguinte na 2ª colocação do grupo com 3 pontos ganhos - 3 a menos que os líderes soviéticos do lendário goleiro Lev Yashin e 1 a mais que os bicampeões mundiais italianos, que voltaram para casa mais cedo do que o previsto.

Vinha a segunda fase e todos já não desdenhavam tanto dos franzinos, mas aguerridos coreanos. O adversário era Portugal, do grande craque Eusébio, em Liverpool no Goodison Park. Os 51.780 pagantes estavam na expectativa sobre o que a nova sensação mundial poderia aprontar diante dos portugueses, que vinham de excelente campanha na 1ª fase com 100% e aproveitamento e foram os responsáveis pela desclassificação do Brasil naquele Mundial. Começo de jogo e logo os comandados de Myung Rae-Hyun mostraram que não estavam apenas de passagem pela Inglaterra - mal foi dado o pontapé inicial e Pak Seung-Zin tratou de colocar os asiáticos na frente. E haja português correndo atrás de coreano, que imprimiam velocidade alucinante e chegaram ao 2º gol com Lee Dong-Woon aos 21. Três minutos depois o inacreditável acontecia: Yang Sung-Kook fazia o terceiro e deixava boquiabertos os torcedores presentes à partida. Porém a intensa correria uma hora teria de ser domada, e do outro lado havia um certo ponta-de-lança chamado Eusébio. O Pantera Negra, como é mais conhecido mundialmente, foi o nome não só do jogo, mas da Copa do Mundo, quando foi o artilheiro com 9 gols. Pouco tempo depois do 3º gol norte-coreano, Eusébio marcou o primeiro dos lusos, contudo a vantagem ainda era muito boa para a Fúria Comunista. Mas a superioridade técnica portuguesa começava a se sobrepor aos bravos, porém desprovidos de técnica coreanos. Aos 42 minutos o camisa 13 português mais uma vez dava o ar da graça e fazia o segundo em cobrança de pênalti. No tempo final os guerreiros da Ásia sucumbiram à maestria do Pantera e tomaram mais dois gols seus - aos 9 e aos 12 minutos (este novamente de pênalti). Atordoados com a virada portuguesa não ofereceram mais resistência e ainda permitiram o 5º gol anotado por José Augusto. Chegava ao fim a trajetória da grata surpresa vindo do oriente, mas ficou o reconhecimento pelo grande esforço desses notáveis "cavalos alados coreanos" que proporcionaram vôos mais altos para as seleções de menor expressão.

Tamanha a façanha dos norte-coreanos que foi tema de um documentário chamado "O jogo de suas vidas" (The game of their lives), de autoria de Daniel Gordon e produzido por Nicholas Bonner, que foi lançado em 2002. A produção conta a mítica história da surpreendente Coréia do Norte na Copa de 1966 e mostra como estão 7 sobreviventes e país que assustou o mundo de uma forma que todos ficaram encantados, e não apavorados como nos dias atuais.

Por questões de dificuldades de se obter informações junto a qualquer órgão pertencente à República Democrática da Coréia (que de democrática não tem nada, infelizmente), dados e estatísticas da seleção nacional coreana são bastante escassos. Por exemplo, não houve como saber quem foi o jogador que mais vezes foi convocado ou seu artilheiro. Entretanto o máximo que pode-se obter está logo a seguir.


ASSOCIAÇÃO DE FUTEBOL DA REPÚBLICA DEMOCRÁTICA DA CORÉIA

* Apelidos: Chollima (cavalo alado) e Fúria Comunista

* Técnico: Kim Jong-Hun

* Uniformes: Camisa, calção e meiões vermelhos (titular); camisa, calção e meiões brancos (reserva)

* Ranking da FIFA: 106º lugar (junho de 2009)

* Principais jogadores: Pak Doo-ik, Pak Seung-Zin, Jong Tae-Se, Ji Yun-Nam e Ahn Young-Hak

* Primeiro jogo: China 0 x 1 Coréia do Norte, em Pequim/CHI, no dia 07 de outubro de 1956

* Maior vitória: Coréia do Norte 21 X 0 Guam, em Taipei/TWA, no dia 11 de março de 2005

* Maior derrota: Bulgária 6 X 1 Coréia do Norte, em Sófia/BUL, no dia 25 de maio de 1974

* Copas do Mundo (2): Inglaterra (1966) e África do Sul (2010 - a participar)

* Copa Asiática de Seleções (2): Kuwait (1980) e Japão (1992)




Escudo: arquivo pessoal
Foto 1: Spidered News
Foto 2: Boston Herald

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